Por que voto em Aécio Neves?

Terraço Debate | por Bolívar Lamounier*, especial para o Terraço Econômico

Começo homenageando o Conselheiro Acácio: voto em Aécio pelas coisas boas que ele representa e para evitar as coisas más que a “doutora” Dilma encarna.

Nem o petista mais azedo contestará a qualidade de Aécio Neves como líder político. Jovem ainda, ele já foi presidente da Câmara dos Deputados e governador de Minas Gerais; agora é Senador da República.

Quem o ouve, logo percebe que é dono de um raciocínio invejavelmente articulado e de uma expressão verbal que não se via na política brasileira desde Fernando Henrique Cardoso. Não precisa de “ponto” no ouvido, nem de marqueteiro que o municie com fórmulas prontas. Aécio expressa seu pensamento com naturalidade, jamais submetendo o vernáculo a sessões de tortura cruéis e prolongadas, como faz sua adversária.

Meu leitor e minha leitora quererão talvez me interpelar: não estarei aqui me atendo a um aspecto formal, em detrimento do conteúdo? Valorizando a simples retórica, um atributo externo, quando o que interessa é o programa, a ideologia, o contraste entre visões do Brasil e do mundo?  Ledo engano. A linguagem diz muito sobre quem a utiliza. A qualidade, a riqueza e a fluência da expressão verbal de uma pessoa são um caminho seguro, uma estrada régia que nos permite conhecer sua alma e avaliar sua capacidade. Dilma Rousseff não consegue sustentar a concordância verbal ao longo de três sentenças, e muito menos construir um parágrafo sem as muletas estatísticas e econômicas que esgrime como que para acentuar seu perfil burocrático. Limitações dessa ordem não necessariamente prejudicam o desempenho de um assessor técnico, mas em política são evidentemente fatais, ainda mais em se tratando da mais alta magistratura de uma Nação. A pobreza verbal é ao mesmo causa e sintoma de um pensamento mal cultivado, mal desenvolvido, incapaz de discernir nuances e descortinar horizontes mais largos. E não foi isso o que presenciamos, dia após dia, nos três anos e quase dez meses em que ela fez uso da poltrona presidencial?

[caption id="attachment_1948" align="aligncenter" width="465"]aecio-neves-foto-george-gianni-psdb- Aécio Neves, a esperança da oposição para derrotar o PT nos próximos dias[/caption]

Voltemos, porém, a Aécio Neves. A qualidade dele como líder político não se dá a conhecer só através da linguagem, mas também através da cultura política mineira, uma das mais ricas dentre as várias tradições regionais brasileiras. Não, meu caro leitor e minha cara leitora, não vou martelar aqui a estereotipada imagem do mineiro esperto, conciliador etc : da política como a arte de negociar falando ao pé do ouvido. A tradição mineira a que me refiro remonta a Bernardo Pereira de Vasconcelos, um dos maiores nomes do período imperial; a Afrânio de Melo Franco, no começo do século 20; a Milton Campos e Juscelino Kubitschek, nos anos cinquenta. Sem esquecer, naturalmente, a figura superlativa de Tancredo Neves, uma carreira de cinco décadas que culmina no trabalho de mestre que foi a desmontagem do regime militar e o pacífico restabelecimento do regime civil e democrático – trabalho realizado em conjunção com Ulisses Guimarães, Franco Montoro, Fernando Henrique Cardoso, Afonso Arinos de Melo Franco e outros.

Claro, pelo ângulo da subcultura esquerdoide que se difundiu de duas ou três décadas para cá, as figuras mencionadas são espécimes comuns da “oligarquia”, da “elite conservadora” etc. Não percamos tempo com essa logorreia. Cito-a apenas para facilitar a apreensão da perspectiva histórica. Aécio Neves participou, não nos esqueçamos, da Constituinte de 87-88. Neto de Tancredo, ali ele conviveu com todas as personalidades políticas a que me referi e com seus numerosos equivalentes de todas as regiões do país. Aquele convívio diário permitiu-lhe reforçar e aprofundar a generosa e progressista visão social insculpida na Constituição de 88 ; a mesma Constituição, lembremos, que o PT se recusou a assinar, como antes se recusara a apoiar o retorno à democracia encarnado por Tancredo, optando pelo risco do prolongamento disfarçado da ditadura na pessoa de Paulo Maluf.

O cidadão que ouviu e deu crédito aos insidiosos ataques feitos contra Fernando Henrique por Lula no inicio de seu primeiro mandato, não sabe o que agora o espera. A “herança maldita” a que Lula se referia era uma economia estabilizada após 33 anos seguidos de alta inflação; uma política social articulada em diversas vertentes, dentro de uma concepção prática e moderna; um país internamente pacificado e respeitado no concerto mundial. Até vale abrir aqui um parêntesis e perguntar como teria sido o período de Fernando Henrique se Lula o tivesse derrotado nas eleições de 1994. Apegado ao radicalismo raivoso de sua formação política e aconselhado pela plêiade de economistas paleo-desenvolvimentistas de seu partido, como teria ele manejado uma inflação em veloz trajetória hiper-inflacionária? Com uma economia fadada a uma crise provavelmente prolongada, como iria arbitrar o embate de tantos interesses colidentes – já nem digo no país, mas em seu próprio partido e nos “movimentos sociais” que ele satelitizava? Daria uma de Hugo Chávez? Talvez nem isso; talvez muito pior, posto que Lula não provinha, como Chávez, das Forças Armadas, e nunca deu indicio algum de uma coragem pessoal comparável à de seu tresloucado amigo venezuelano.

[caption id="attachment_1951" align="aligncenter" width="453"]lamounier Bolívar Lamounier, cientista político brasileiro[/caption]

Lula teve a enorme sorte de NÃO se eleger em 1994, chegando ao poder 8 anos depois. Beneficiou-se da “herança maldita” e da transição leal e impecavelmente organizada por seu antecessor. E não precisou se haver com uma oposição furibunda como a que o PT moveu contra Fernando Henrique. Apesar do “mensalão”, cujos desdobramentos radioativos ainda hoje contaminam a política brasileira, Lula conseguiu, entre algumas iniciativas acertadas e muitos lances de sorte, atravessar seus dois mandatos.

Era de se esperar que 8 anos na poltrona presidencial lhe adensassem a percepção das virtudes e mazelas inerentes à vida pública: de certas qualidades (nem sempre consignadas na Constituição) que a democracia exige dos governantes, dos riscos que inevitavelmente se constituem no bojo do egocentrismo e de uma gana de poder desmesurada; ou seja, resumindo, da importância do comedimento e da lealdade. Qual o quê. Em 2010, valendo-se de sua enorme popularidade e, como hoje sabemos, de recursos provenientes do propino-petro, Lula cometeu talvez o maior de seus desatinos. Firulas jurídicas à parte, o que ele fez foi arvorar-se em Grande Eleitor Plenipotenciário, açambarcando a legitimidade que a Constituição e a democracia conferem aos partidos políticos e a todo o eleitorado. Não me consta que algo semelhante tenha jamais acontecido numa democracia digna do nome. Instalou no Planalto uma pessoa quiçá proficiente nas lides burocráticas, mas manifestamente despreparada para chefiar o Governo e o Estado.

O resultado foi o que haveria de ser, nem mais nem menos. Ungida presidente, Dilma foi    aos poucos desfiando sua extensa lista de incapacidades. Seus desconhecimentos de economia.  Sua inaptidão gerencial. Sua desorientação frente às forças políticas representadas no Congresso. Sua ignorância em assuntos internacionais. Suas carências até para o papel de demagoga, como se viu na tragicômica peça que levou ao ar a título de responder às demandas populares de junho de 2013. E, não menos importante, sua proverbial truculência.

O nó que nos compete desamarrar está, pois, mais que claro. Na economia, a herança que o Brasil vai receber no dia 1º de janeiro – senão antes- é, agora sim, “maldita”. Não preciso me alongar sobre isso depois das manifestações cristalinas que os mercados (domésticos e internacionais) repetidamente mandaram a quem interessar pudesse, despencando toda vez que Dilma ganhava alguns pontos nas pesquisas de intenção de voto. Na educação, na saúde, na política externa, o quadro é desalentador. E, como se não bastasse, o Brasil é hoje um país dividido. Dividido de alto a baixo. Nisto o capenga sub-marxismo petista – o “povo” contra a “zelite” – atingiu o resultado pretendido. A divisão rancorosa que se difundiu e ao que tudo sugere se arraigou entre nós não se desfará da noite para o dia. Precisará ser desfeito passo a passo, com persistência e habilidade. Eleito Aécio, sua convocação terá esse sentido, já começando a desfazer a política lulista do fígado. Eleita Dilma, uma grande incógnita continuará a pairar sobre o Brasil. Por quanto tempo? Não sabemos, evidentemente; só sabemos que é pura perda de tempo perguntar isto a ela ou ao Lula.

*Bolívar Lamounier doutor em ciência política pela UCLA,   sócio da consultoria Augurium e autor de “Da Independência a Lula”, “Conversa em Família”, entre outros livros

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